5.11.08

hoje, particularmente

hoje estou particularmente irritado. se é que se pode estar irritado particularmente. irritado sozinho. fechado. irritado só para nós. egoísmo ao extremo. a minha irritação. hoje apetece-me sair daqui. é um dos dias em que mais me apetece sair daqui. nada aconteceu em particular - lá está o particular a perseguir-me. um dia normal, igual a tantos outros. os pedais da bicicleta trazem-me ao trabalho e levam-me a casa. o almoço espera-me à mesa. os cães olham-me, esperando pela hora de alçarem a pata, ora esquerda ora direita (sim, porque mesmo tendo uma cadela, ela também o faz...com uma técnica particular). lavo os dentes. às vezes uso a sanita, que não foi o caso. faço contas à vida (nunca percebi como é que a matemática e vida podem estar ligadas). apanho pêlos do chão. recebo a mesma chamada de ontem e de amanhã do meu pai. só uma coisa diferente aconteceu. cometi a loucura de levar uns livros que nunca usei - sim, porque eu uso os livros - a um alfarrabista. quanto me dá por estes livros? não os uso, disse-lhe. estão a mais em minha casa. não preciso do dinheiro que me vai dar por eles, mas estão a mais lá em casa. ninguém os usa - repeti. deve ser por isso. inconscientemente deve ter-me afectado. nunca vendi livros. aqui posso usar o nunca. nunca vendi livros. um momento que me alterou, talvez, o resto do dia. desfazer-me das coisas de que gosto custa-me. ainda para mais de livros. mas estes livros não os usava. posso deixá-los e passo aqui logo. abandonei os meus livros. lá. tem uma ideia do preço que quer por eles? não, não pensei sequer nisso. não os uso, por isso. como o facto de nunca os ter usado, lhes reduzisse ou aumentasse alguma vez o preço. nunca foram sequer abertos - disse. menti. ele sabe que menti. passo cá logo, ou amanhã. passo cá quando tiver tempo. tenho sempre tempo. sempre. penso portanto que tenha sido este pequeno momento do dia que me fez irritar. e talvez as vozes no emprego. vozes que se fazem ouvir alto. sem nada para dizer, mas alto. gritam. gritam alto. gritam...alto? não tenho paciência. melhor, hoje não tenho paciência. apetece-me sair daqui, bater com a porta atrás de mim. pegar na minha bicicleta e descer a rua. apetece-me entrar no alfarrabista e perguntar pelos meus livros. não me apetece ouvir dizer que ainda não pensaram que preço têm para me propor. não venho buscar o dinheiro. venho buscar os meus livros. quero usá-los. tem um de religião muito bom. dizem. se não servir para ler, serve para secar o óleo das batatas fritas. as batatas fritas que nunca faço. mas se um dia fizer, estarão abençoadas. estou particularmente irritado. agora só penso em salvar os livros que abandonei. como fui capaz. ai as batatas fritas...

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